Republico o poema de António Feijó.
E agora com maioria de razões.
(A um pequenito vendedor de jornais)
Bairro elegante, - e que miséria !
Roto e faminto, à luz sidéria,
O pequenito adormeceu ...
Morto de frio e de cansaço,
As mãos no seio, erguido o braço
Sobre os jornais que não vendeu.
A noite é fria; e a geada cresta,
em cada casa sinais de festa !
E o pobrezinho não tem lar ...
Todas as portas já cerradas !
Ó almas puras, bem formadas,
Vede as estrelas a chorar !
Morto de frio e de cansaço,
As mãos no seio, erguido o braço
sobre os jornais que não vendeu .
Em plena rua, que miséria !
Roto e faminto, à luz sidéria,
O pequenito adormeceu ...
Em torno dele - ó luz sagrada !
Ao ver um círculo sem geada
Na sua morna exaltação,
Pensei se o frio descaroável
Do pequenino miserável
Teria mágoa e compaixão ...
Sonha talvez, pobre inocente !
Ao frio, à neve, ao luar mordente,
Com o presépio de Belém ...
Do céu azul, às horas mortas,
Nossa Senhora abriu-lhe as portas
E aos orfãozinhos sem ninguém ...
E todo o céu se lhe apresenta
Numa grande árvore que ostenta
Coisas de um vivido esplendor,
Onde Jesus, o Deus menino,
Ao som de um cântico divino
Colhe as estrelas do Senhor ...
E o pequenino extasiado
Naquele sonho iluminado
De tantas coisas mortais,
- No céu azul, pobre criança !
Pensa talvez, cheio de esperança
Vender melhor jornais.
António Feijó
Todos os homens são livres e iguais em direitos; e todavia, alguns são livres para morrer à fome e iguais para morrer de frio. (António Soveral-1905)
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