terça-feira, 23 de novembro de 2010

GREVE GERAL

Para que fiquem esclarecidas, desde o princípio, posições sobre o que vai suceder no dia 24 é bom afirmar que a greve é um direito inalienável dos trabalhadores, lato senso, constitucionalmente consagrado e que apoio inequívocamente.
A greve é a recusa colectiva e concertada do cumprimento das condições do contrato de trabalho tendo como objectivo promover o êxito de reivindicações dirigidas à entidade empregadora ou a terceiros.
A greve é, pois, a mais forte arma reivindicativa ao dispor dos trabalhadores; é para usar, e deve ser usada, sempre que forem considerados em perigo efectivo os direitos desses mesmos trabalhadores .
Até aqui, e sem reparo algum, posso afirmar que,caso me encontrasse no activo, aderiria, certamente, à greve geral.
Agora, existem, no entanto, outros considerandos a fazer.
-Existem motivos para a convocação da greve ? Sim!
-Existe aproveitamento político lateral na mesma convocação ? Talvez!
-Está verdadeiramente definido o destinatário da greve ? Não !
Se na primeira resposta, creio, não existe qualquer dúvida já nas duas seguintes pode-se ter de pensar um pouco.
É claro que as organizações sindicais, jurando a sua independência, afirmarão que não existe qualquer aproveitamento político-partidário. Estão no seu papel. Mas talvez não seja crível que assim seja já que, muito anteriormente à convocação da greve geral existiam já partidos, e fundamentalmente um, que afirmavam a necessidade de uma resposta efectiva e concertada às "malfeitorias" da política governamental e nisso inclui o uso desta arma. É o aproveitamento politico-partidário de uma situação que podendo englobar, como certamente irá acontecer, cidadãos das mais díspares tendências ideológicas, ou mesmo sem ideologia alguma, tenderá a ser reflectido como apoio às ideias anteriormente expressa por esses mesmos partidos políticos. Mas também, na verdade, isso não é um facto novo em política.
Por último a definição do destinatário da greve.
Para a grande maioria dos que se manifestarão exercendo o seu direito legítimo à greve, o Governo será o destinatário da acção.
Na realidade, as políticas adoptadas nos últimos dois anos têm a chancela do Governo. É um facto!
Convém, no entanto, reflectir sobre se o Governo teria outra alternativa realista que não fosse promover as ditas medidas.
Perante a crise global em que o Mundo entrou, as hecatombes financeiras internacionais verificadas, o Governo português só poderia passar ao lado dessas medidas se acaso elas não tivessem a mínima repercussão interna; e toda a gente sabe que isso não é verdade.
A crise iniciada no EUA transformou num sufoco  as economias de todo o Mundo.
Não foi por acaso que a Islândia, até aí considerado um paraíso, entrou em falência e hoje está na situação em que está.
Dirão que a culpa não foi nossa; foi das más apostas económicas e no mercado dos produtos financeiros levadas à prática pelos agentes económicos da Islândia com a complacência governamental. Correcto ! Mas não nos passa ao lado. Castiga-nos. Porque logo de seguida se começaram a destapar uma série de buracos nos mais diversos países, começaram a rebentar uma série de "bolhas", que levaram a uma cada vez maior interdependência das economias na contabilização dos prejuizos causados.
Então que se punissem os causadores de tanto infortúnio. Pois é aí que a porca torce o rabo.
Os causadores acabaram por ter de ser os beneficiários de políticas estatais de apoio às suas organizações a fim de que as mesmas, correndo o risco de estoirarem financeiramente, não viessem a provocar, por via de uma bola de neve, a miséria nos diferentes países a braços com tais situações.
No nossa país, mesmo assim, não se repercutiram as consequências ao mesmo nível de outros estados.
A nossa Banca estava firme, embora sempre carente do financiamento externo, e não houve "bolhas" especiais. Então o que sucedeu ?
O que se esperava !
Diminuição do consumo, quebra nas exportações, despedimentos e falências que arrastaram uma maior necessidade por parte do Estado de dar cobertura social aos novos desempregados.
Com as dificuldades no financiamento externo o Estado viu-se obrigado a apoiar a Banca e rebentam dos bancos portugueses (BPN e BPP).
Dir-se-à que o Governo não previu. É verdade! O Governo português  e a grande maioria dos outros.
Os problemas económicos e financeiros arrastaram quase todos os países, mormente os europeus, para situações difíceis de encarar. Claro que, quanto mais débil a economia, mais difícil seria a recuperação, mais cáusticas seriam as condições a impor para ultrapassar o problema.
Por outro lado o nosso país faz parte de uma União, que e quer europeia, mas que muitas das vezes parece ser só de alguns. E que respostas efectivas deu a União ?
E aqui é que está o verdadeiro assunto.
A União Europeia, união económica e monetária de 27 países europeus, não soube ou não quis tomar uma posição diferente no problema e escolheu o caminho que mais penalizava as populações e não as instituições, muitas delas responsáveis e causadoras das agruras que agora se vivem. Preferiu proteger os culpados em detrimento das vítimas. Claro que isso também é fruto da composição ideológica maioritária das cúpulas da União mas, quanto a isso, nada se pode fazer já que depende da composição do Parlamento Europeu que todos nós votámos, ou deveríamos ter votado. Talvez para a próxima não exista tanta abstenção nas eleições europeias. Os cidadãos também aprendem com os seus erros.
Aqui chegados podemos concluir que o verdadeiro destinatário será o sistema internacional vigente no que respeita à economia e finanças,e, no nosso caso, o directório da União Europeia. O Governo português mais não pôde que, com realismo, fazer face às condições que lhe são apresentadas e tentar gerir com a melhor sensatez. Mesmo assim está a ser diariamente pressionado pelos "mercados", os tais  que também são integrados pelo causadores de todo este imbróglio, mas que, à boa maneira capitalista, estão mais preocupados com os seus resultados do que com as dificuldades que promoveram.
Por isso, eu estaria muito mais contente se a greve geral de amanhã tivesse sido convocada por uma união sindical europeia, com paralisação da Europa por um dia. Aí sim ! Era grave e muitos dos que hoje assobiam para o lado talvez franzissem o sobrolho e se preocupassem verdadeiramente com a resolução dos problemas dos cidadãos europeus. Assim, sentiriam o chão a fugir-lhes debaixo dos pés e nada voltaria a ser como dantes, Sentiriam, verdadeiramente, a força da sociedade europeia e o seu descontentamento , senão, revolta.
Portugal vai ter amanhã a sua segunda greve geral em democracia que, como já disse, apoiaria, mas aparte o ruído interno, pouco ou nada valerá no contexto da Europa.
Já agora, só um número. Se houver uma participação de cerca de 85% o prejuízo para o Estado é equivalente  ao valor que o Ministro das Finanças teve de cortar no Orçamento para 2011 para obter a anuência do PSD - cerca de 500 milhões de Euros.

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