Escreveu, no DN de ontem, o padre e filósofo Anselmo Borges um novo artigo cujo título corresponde ao título deste post.
Começa por fazer uma resenha das posições que ao longo dos tempos foram sendo transmitidas aos crentes; desde o Levítico, aos relatos sobre Sodoma e Gomorra e o incidente em casa de Lot, seguindo-se as posições de S. Tomás de Aquino, S. Paulo e do Catecismo da Igreja Católica, assim como uma posição tomada pelo Dalai Lama em 2001 e uma menção aos debates que têm vindo a suceder no seio da igreja Anglicana e que levou recentemente à cisão pelo movimento mais tradicionalista.
Mas o padre Anselmo Borges não se fica por aqui, o que seria extremamente fácil. Sai da esfera do religioso a acerca-se da parte civil e refere a posição de 1993 da Organização Mundial de saúde que excluí a homossexualidade da lista de doenças mentais. Menciona, igualmente, o apelo lançado por 66 países para que fosse universalmente despenalizada a homossexualidade. De notar que o Vaticano apoiou este apelo.
Afirma depois o articulista, e é esta independência que me faz não perder um artigo deste teólogo e professor universitário, que não existem razões para vedar o sacramento da comunhão a quem tem esta orientação sexual, após o que discorre sobre o casamento em si mesmo.
Anselmo Borges considera, e bem, que o Estado devia providenciar uma forma de união com consequências jurídicas semelhantes à dos casados heterossexuais. E então é que levanta aquilo que parece ser o fulcro da situação:
“...a questão reside em saber se há-de chamar-se casamento. O problema é mais do que religioso e as palavras não são indiferentes, pois não pode dar-se o mesmo nome ao que é diferente.”
Socorre-se para tanto das palavras do ateu Bertrand Russell sobre o casamento:
“...o casamento é algo mais sério do que o prazer de duas pessoas na companhia uma da outra : é uma instituição que, através do facto dela provirem filhos, forma parte da textura íntima da sociedade, e tem uma importância que se estende muito para além dos sentimentos pessoais do marido e da mulher...”
E conclui :
“Assim, o que a sociedade tem de resolver é se considera o casamento essa instituição ou uma mera contratualização de afectos.”
Pois bem. Mais uma vez saúdo o saber e a inteligência do padre Anselmo Borges para além do facto, não mencionado por Russell, dos casais hetero que não querem ou não podem ter filhos; não deixam de ser casamentos e não se baseiam só no prazer. No entanto, parece-me que o fundamental para que o assunto seja resolvido, é um problema de sinonímia ou de semântica, considerando neste último caso a evolução do significado da palavra.
O problema já não é entre casamento religioso ou civil.
O problema já não é o sexo dos nubentes.
O problema reside no que se lhe deve chamar.
Casamento, e para ir buscar o dicionário mais antigo que possuo, é a “União legal entre homem e mulher”, sendo casamento civil: o que se contrai perante as autoridades administrativas, com as formalidades legais.
Só à guisa de piada, no mesmo dicionário casamento também é sinónimo de “Boa harmonia”.
Pois é, mas isto são sinónimos baseados no tempo e na lei vigente à data da edição do dicionário, não sendo, contudo, muito diferentes dos actuais..
Mas o nosso tempo é outro, e as leis estão em permanente mutação.
Se vier a existir uma lei que diga que uma união administrativa contraída perante as autoridades, com as formalidades legais, pode ser estendida a pessoas do mesmo sexo, os dicionários de amanhã, certamente, farão cair a especificação de obrigatoriedade de serem de sexo diferente.
Daí o poder legalmente chamar-se casamento, sem peias nem artifícios, que parece ser o que se quer neste momento.
E voltando à “boa harmonia” essa consegue-se sempre que as pessoas dela possam desfrutar, seja o casamento “civil”, “canónico”, “de consciência” ou “de mão esquerda”.
Para consulta integral do artigo aceda a :
http://dn.sapo.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=1413190&seccao=Anselmo Borges&tag=Opini%E3o - Em Foco
Todos os homens são livres e iguais em direitos; e todavia, alguns são livres para morrer à fome e iguais para morrer de frio. (António Soveral-1905)
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3 comentários:
Assino por baixo.Cumprimentos.
Miguel(T.Mike),
Pergunto-me se o padre Anselmo Borges não será o único que consegue analisar as questões com objectividade dentro da hierarquia da igreja. Ou será porque também é filósofo e, nesta qualidade, tem que ser intelectualmente honesto?
Obrigada pelo seu texto, que me deu a conhecer esta posição sobre o assunto, que desconhecia.
Um abraço.
Josefa
Maria Josefa,
ao sábado nunca perco o DN só para ler o padre Anselmo Borges.
São sempre artigos de grande interesse.
Vale a pena.
Ainda mais um abraço.
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